Inauguração do Novo Templo da Assembleia de Deus em Zortéa-SC |
Prof. Dr. Adelcio Machado dos Santos Jornalista (MT/SC 4155)
Em primeiro lugar, no cenário político brasileiro, os partidos políticos desempenham um papel central na organização da vida democrática, sendo os principais instrumentos de representação da sociedade junto ao Estado.
Contudo, uma particularidade jurídica gera constantes debates: conquanto exercerem funções públicas essenciais, os partidos políticos são considerados, formalmente, entes de natureza privada. Essa dualidade – entre o caráter público das funções e a natureza jurídica privada – impõe reflexões sobre o papel, os limites e as responsabilidades dessas organizações na democracia brasileira.
A Constituição Federal de 1988 confere aos partidos políticos um status privilegiado no ordenamento jurídico. Seu artigo 17 assegura a liberdade de criação, fusão, incorporação e extinção dos partidos, desde que respeitados os preceitos constitucionais, como o regime democrático, o pluripartidarismo e os direitos fundamentais.
No entanto, não se confere a esses entes personalidade jurídica de direito público, como ocorre com os órgãos da administração direta ou autárquica. Os partidos devem registrar seus estatutos no Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas, como qualquer associação civil, e posteriormente no Tribunal Superior Eleitoral, para adquirirem legitimidade plena para atuar no processo eleitoral.
De outro vértice, essa classificação como entes privados não é meramente formal. Ela reflete uma concepção liberal de que os partidos são expressões da sociedade civil organizada e, portanto, devem manter certa autonomia em relação ao Estado. Tal autonomia inclui a liberdade de organização interna, a definição de seus programas ideológicos e critérios de filiação.
Contudo, os partidos recebem recursos públicos – por meio do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanhas –, utilizam tempo gratuito de rádio e televisão e exercem funções públicas como a seleção de candidatos e a representação da vontade popular no Legislativo. Essa sobreposição entre o privado e o público desafia as fronteiras tradicionais do Direito.
Na práxis, a natureza privada dos partidos tem implicações relevantes. Por exemplo, o regime de responsabilização civil e penal dos dirigentes partidários segue, em regra, os moldes das entidades privadas. O controle interno de seus atos, inclusive o disciplinamento de seus filiados e parlamentares, também se dá com ampla autonomia, ainda que sujeito à revisão judicial em casos de violação de direitos fundamentais.
Entrementes, a Justiça Eleitoral exerce um controle rigoroso sobre a legalidade dos estatutos, a prestação de contas e a conformidade com as regras eleitorais, justamente em razão do papel essencial que os partidos exercem na condução da democracia.
Outro aspecto relevante é o impacto dessa natureza híbrida na transparência e na accountability. Sendo entes privados com funções públicas, os partidos políticos frequentemente se encontram em uma zona cinzenta quanto à obrigação de publicidade de seus atos. Embora haja crescente exigência legal e social por maior transparência – especialmente após a promulgação da Lei de Acesso à Informação e decisões do Supremo Tribunal Federal nesse sentido –, ainda se observa resistência por parte de alguns partidos em se submeterem aos mesmos padrões exigidos de instituições públicas.
Ademais disso, a natureza privada tem permitido, por vezes, uma excessiva concentração de poder nas direções partidárias, dificultando a democratização interna dos partidos. Muitas legendas funcionam de forma centralizada, com pouca participação das bases na definição de candidaturas ou na elaboração de programas.
Isso reforça um modelo de partido cartorial, distante da militância e da sociedade, o que compromete sua legitimidade e eficácia na representação política. A legislação eleitoral já prevê a exigência de estatutos que garantam funcionamento democrático interno, mas, na prática, sua aplicação é limitada.
Com o advento da minirreforma eleitoral de 2015 e as mudanças mais recentes na jurisprudência eleitoral, buscou-se corrigir alguns desses desequilíbrios, como o fim das coligações proporcionais e a cláusula de desempenho. Tais medidas visam incentivar a consolidação de partidos com maior representatividade e coerência ideológica, desestimulando a proliferação de siglas meramente oportunistas, muitas vezes criadas apenas para acessar recursos públicos.
Isso posto, o sistema partidário brasileiro continua fragmentado, com dezenas de legendas registradas e ativa participação no processo eleitoral, dificultando a governabilidade e a coesão programática.
Em última análise, os partidos políticos no Brasil vivem uma tensão permanente entre a sua natureza privada e as funções públicas que exercem. Enquanto entes privados, gozam de autonomia e liberdade, valores caros à democracia.
Entretanto, enquanto instrumentos essenciais à representação política e ao funcionamento do regime democrático, devem ser submetidos a mecanismos eficazes de controle, transparência e democratização. O repto que se coloca é equilibrar essas dimensões, de modo a fortalecer os partidos como verdadeiros mediadores entre a sociedade civil e o Estado, e não como meros instrumentos de poder de grupos específicos.
Em epítome, a maturidade democrática do Brasil dependerá, em grande parte, da capacidade dos partidos em assumirem plenamente o cometimento público.
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