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Prof. Dr. Adelcio Machado dos Santos Jornalista (MT/SC 4155)
Em primeiro lugar, Hermeto Pascoal figura na galeria da música brasileira. Multi-instrumentista, compositor e arranjador, sua carreira é marcada por uma inventividade sem limites, uma ousadia estética rara e uma contribuição inestimável para o cenário musical nacional e internacional. Conhecido por sua aparência excêntrica, barba branca e cabelos longos, Hermeto é, acima de tudo, um artista cuja obra rompe fronteiras estilísticas e desafiou, desde sempre, as convenções tradicionais da música.
De outro vértice, nascido em 22 de junho de 1936, no pequeno povoado de Lagoa da Canoa, no agreste alagoano, Hermeto cresceu em uma família de músicos. Cego de nascença por causa da catarata congênita, só viria a recuperar parte da visão mais tarde. Essa condição o levou a desenvolver uma percepção musical extremamente aguçada. Desde criança demonstrou sensibilidade para os sons e, mesmo sem acesso formal à educação musical, aprendeu a tocar acordeom, flauta, piano, saxofone, baixo, e praticamente qualquer instrumento que encontrasse. Sua capacidade de extrair sons e transformá-los em música extrapola os limites do convencional: Hermeto é capaz de transformar utensílios domésticos, brinquedos, água, panelas, chaleiras, e até o corpo humano em instrumentos musicais.
Destarte, nos anos 1960, Hermeto começou a ganhar notoriedade no meio musical ao integrar grupos como o Sambrasa Trio e o Quarteto Novo, ao lado de grandes nomes como Airto Moreira e Theo de Barros. O Quarteto Novo foi responsável por impulsionar a carreira de Elis Regina e, sobretudo, de Hermeto, cujo talento logo chamou a atenção de músicos internacionais. Na década de 1970, Hermeto se mudou para os Estados Unidos e passou a colaborar com nomes consagrados do jazz, como Miles Davis, que o chamou de “o músico mais impressionante do planeta”. De fato, Hermeto foi um dos poucos brasileiros a gravar com Miles, tendo composições suas incluídas no álbum "Live-Evil", de 1971.
A partir de então, Hermeto consolidou sua carreira solo e passou a liderar sua própria banda, reunindo músicos jovens e experientes que o acompanhavam em projetos ousados. Seus discos como "Slaves Mass" (1977), "Zabumbê-Bum-Á" (1979) e "Lagoa da Canoa, Município de Arapiraca" (1984) são marcos da música instrumental brasileira. Hermeto mistura frevo, maracatu, choro, jazz, baião, música erudita e experimentalismo em uma linguagem única, impregnada de brasilidade, virtuosismo e humor. Sua música, por vezes densa e complexa, não se submete a classificações fáceis. Ele mesmo rejeita rótulos e se recusa a definir seu estilo como jazz ou música popular brasileira. Para ele, tudo é som, e o som é liberdade.
Por conseguinte, a originalidade de Hermeto também se manifesta em suas partituras e métodos de composição. Ele criou técnicas próprias, como a chamada “música universal”, termo que cunhou para descrever uma música que ultrapassa barreiras culturais, estilísticas e linguísticas. Em 1996, escreveu uma peça musical por dia durante todo o ano, num total de 366 composições, como uma homenagem a todos os dias do calendário. Essa impressionante coleção foi reunida no projeto “Calendário do Som”, hoje estudado por músicos do mundo inteiro. Hermeto também defende uma relação intuitiva com a música, mas sem renunciar ao estudo e do rigor técnico. Em suas oficinas e “workshops”, ensina que todos podem ser músicos, desde que tenham disciplina, escuta e respeito pelos sons.
Conquanto, muitas vezes, ser considerada de difícil acesso, Hermeto é um artista profundamente conectado com o povo. Suas apresentações ao vivo são experiências sensoriais e performáticas, nas quais se alternam momentos de êxtase coletivo, improvisação e virtuosismo. Ele interage com o público, improvisa com sons do ambiente e revela, a cada apresentação, o espírito lúdico e provocador que o caracteriza. É comum vê-lo regendo o público, incorporando objetos inusitados aos arranjos ou fazendo solos com a voz, como se cada parte do seu corpo fosse um instrumento. Essa abordagem contribuiu para transformá-lo em uma lenda viva da música.
Hermeto Pascoal recebeu ao longo de sua carreira inúmeros prêmios e homenagens. É reconhecido como patrimônio cultural vivo e sua obra é referência tanto para músicos eruditos quanto populares. Sua influência atravessa gerações e fronteiras. Diversos artistas brasileiros e estrangeiros reconhecem nele uma fonte inesgotável de inspiração. Com mais de oito décadas de vida, Hermeto continua ativo, compondo, se apresentando e gravando com a mesma intensidade e criatividade que sempre o acompanharam.
Em epítome, a genialidade de Hermeto Pascoal reside, talvez, em sua capacidade de escutar o mundo como música. Ele transforma o banal em extraordinário, o cotidiano em arte. Sua trajetória é uma celebração da liberdade criativa, da experimentação e do amor incondicional pelo som. Hermeto não apenas toca instrumentos: ele os reinventa, os subverte, os humaniza. Ao longo de sua carreira, construiu uma obra monumental que desafia padrões e amplia horizontes.
Por final, mais do que um músico virtuoso, Hermeto é um visionário, um alquimista dos sons, um mestre que continua a ensinar, pelo exemplo, que a música está em toda parte, basta ouvir com atenção.
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